domingo, dezembro 28, 2008

mário quintana

SEISCENTOS E SESSENTA E SEIS
"A vida são deveres que nós
trouxemos pra fazer em casa.
Quando se vê já são seis horas!
Quando se vê, já é sexta-feira...
Quando se vê, já terminou o ano...
Quando se vê, passaram-se 50 anos!
Agora, é tarde demais
para ser reprovado...
Se me fosse dado, um dia,
outra oportunidade,
eu nem olhava o relógio.
Seguiria sempre em frente
e iria jogando, pelo caminho,
a casca dourada
e inútil das horas... "

Mario Quintana - Esconderijos do Tempo - 1980
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CANÇÃO DO DIA DE SEMPRE

Tão bom viver dia a dia...
A vida assim jamais cansa...
Viver tão só de momentos
Como essas nuvens do céu...
E só ganhar, toda a vida,
Inexperiência...esperança...
E a rosa louca dos ventos
presa à copa do chapéu.
Nunca dês um nome a um rio:
sempre é outro rio a passar.
Nada jamais continua,
tudo vai recomeçar!
E sem nenhuma lembrança
Das outras vezes perdidas,
Atiro a rosa do sonho
Nas tuas mãos distraídas...

Mario Quintana
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Há 2 espécies de chatos: os chatos propriamente ditos e ... os amigos, que são os nossos chatos prediletos."
Mário Quintana
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"Há noites que eu não posso dormir de remorso por tudo o que eu deixei de cometer."
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Da Viuvez
Ele esta morto.Ela, aos ais.
Mas, desse lúgubre assunto,
Quem fica viúvo é o defunto...
Porque esse não casa mais.
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A Carta

"Hoje encontrei dentro de um livro uma velha carta amarelecida,
Rasguei-a sem procurar ao menos saber de quem seria...
Eu tenho um medo
Horrível
A essas marés montantes do passado,
Com suas quilhas afundadas, com
Meus sucessivos cadáveres amarrados aos mastros e gáveas...
Ai de mim,
Ai de ti, ó velho mar profundo,
Eu venho sempre à tona de todos os meus naufrágios!"

Mario Quintana - Apontamentos de história sobrenatural - 1976
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ESPERANÇA

Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano
Vive uma louca chamada Esperança
E ela pensa que quando todas as sirenas
Todas as buzinas
Todos os reco-recos tocarem
Atira-se
E
— ó delicioso vôo!
Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,
Outra vez criança...
E em torno dela indagará o povo:
— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?
E ela lhes dirá
(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)
Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:
— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA...

Mario Quintana
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POESIA

Antes todos os caminhos iam.
Agora todos os caminhos vêm.
A casa é acolhedora, os livros poucos.
E eu mesmo preparo o chá para os fantasmas.

Mário Quintana

80 ANOS DE POESIA
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NEM

Não tenho vergonha de dizer que estou triste,
Não dessa tristeza ignominiosa dos que, em vez de se matarem, fazem poemas:
Estou triste por que vocês são burros e feios
E não morrem nunca...
Minha alma assenta-se no cordão da caçada
E chora,
Olhando as poças barrentas que a chuva deixou.
Eu sigo adiante. Misturo-me a vocês. Acho vocês uns amores.
Na minha cara há um vasto sorriso pintado a vermelhão.
E trocamos brindes,
Acreditamos em tudo o que vem nos jornais.
Somos democratas e escravocratas.
Nossas almas? Sei lá!
Mas como são belos os filmes coloridos!
(Ainda mais os de assuntos bíblicos...)
Desce o crepúsculo
E, quando a primeira estrelinha ia refletir-se em todas as poças
d'água,
Acenderam-se de súbito os postes de iluminação!

MARIO QUINTANA
---------------------------------Uma Alegria para Sempre
Para Elena Quintana

As coisas que não conseguem ser
olvidadas continuam acontecendo.
Sentimo-las como da primeira vez,
sentimo-las fora do tempo,
nesse mundo do sempre onde as
datas não datam. Só no mundo do nunca
existem lápides... Que importa se -
depois de tudo - tenha "ela" partido,
casado, mudado, sumido, esquecido,
enganado, ou que quer que te haja
feito em suma? Tiveste uma parte da
sua vida que foi só tua e, esta, ela
jamais a poderá passar de ti para ninguém.
Há bens inalienáveis, há certos momentos que,
ao contrário do que pensas,
fazem parte da tua vida presente
e não do teu passado. E abrem-se no teu
sorriso mesmo quando, deslembrado deles,
estiveres sorrindo a outras coisas.
Ah, nem queiras saber o quanto deves à ingrata criatura...
A thing of beauty is a joy for ever
- disse, há cento e muitos anos, um poeta
inglês, que não conseguiu morrer.

Mario Quintana – Baú de Espantos - 1986
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a letra e a música"

Quando nos encontramos
Dizemo-nos sempre as mesmas palavras que todos os amantes dizem...
Mas que nos importa que as nossas palavras sejam as mesmas de sempre?
A música é outra!
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Entra o sol, gato amarelo, e fica
à minha espreita, no tapete claro.
Antes de abrir os olhos, sei que o dia
Virá olhar-me por detrás das árvores.

Ah! sentir-me ainda vivo sobre a face da terra
enquanto a vida me devora...
Me espreguiço, entredurmo... O anjo da luz espera-me
Como alguém que vigiasse uma crisálida.

Pé ante pé, do leito, aproxima-se um verso
para canção de despertar;
os ritmos do tráfego vibram como cigarra,

a tua voz nas minhas veias corre,
e alguns pedaços coloridos do meu sonho
devem andar por esse ar, perdidos...

MARIO QUINTANA
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Presença

É preciso que a saudade desenhe tuas linhas perfeitas,
teu perfil exato e que, apenas levemente, o vento das horas
ponha um frêmito em teus cabelos...
É preciso que a tua ausência trescale sutilmente,no ar,
a trevo machucado, a folhas de alecrim há muito guardadas
não se sabe porquê nalgum móvel antigo...
Mas é preciso, também, que seja como abrir uma janela e respirar-te,
azul e luminosa, no ar.
É preciso a saudade para eu te sentir como sinto - em mim - a presença misteriosa da vida...
Mas quando surges és tão outra e múltipla e imprevista que nunca te pareces com o teu retrato...
E eu tenho de fechar meus olhos para ver-te!!

Mário Quintana
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"AMAR É MUDAR A ALMA DE CASA. "

sábado, dezembro 27, 2008

joão guimarães rosa

"O senhor... Mire veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas - mas que elas vão sempre mudando. Afinam e desafinam. Verdade maior." - de grande sertão
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"Eles se disseram, assim eles dois, coisas grandes em palavras pequenas, ti a mim, me a ti, e tanto". do conto "A Partida do Audaz Navegante".
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A gente pensa que vive por gosto, mas vive por obrigação.
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O mundo se repete mal por que há um imperceptível avanço.
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"É preciso sofrer depois de ter sofrido,e amar,e mais amar,depois de ter amado."
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"A estrada do amor,a gente ja esta mesmo nela,desde que nao pergunte por direcao nem destino.E a casa do amor -em cuja porta nao se chama e nao se espera- fica um pouco mais adiante." - sagarana
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"Digo: o real não está na saída nem na chegada, ele se dispõe pra gente é no meio da travessia." (Grande Sertão Veredas)
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De "Desenredo"
"Todo abismo é navegável a barquinhos de papel"
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"Quando escrevo, repito o que já vivi antes. E para estas duas vidas, um léxico só não é suficiente. Em outras palavras, gostaria de ser um crocodilo vivendo no rio São Francisco. Gostaria de ser um crocodilo porque amo os grandes rios, pois são profundos como a alma de um homem. Na superfície são muito vivazes e claros, mas nas profundezas são tranqüilos e escuros como o sofrimento dos homens."
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"Eu sou é eu mesmo, divêrjo de todo mundo. Eu quase que não sei de nada, mas desconfio de muita coisa."
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"A vida inventa! A gente principia as coisas, no não saber por que, e desde aí perde o poder de continuação - porque a vida é mutirão de todos, por todos remexida e temperada."
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"Dói sempre na gente, alguma vez, todo amor achável, que algum dia se desprezou..."
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"Para ódio e amor que dói, amanhã não é consolo."
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saramago...

"Ainda cá ficaremos milênios e milênios em constante nascer e morrer, e se o homem tem sido, com igual constância, o lobo e o carrasco do homem, com mais razões ainda continuará a ser o seu coveiro. "
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"Todos temos os nossos momentos de fraqueza,ainda que nos vale é sermos capazes de chorar, o choro muitas vezes é uma salvação, há ocasiões em que morreríamos se não chorássemos."-
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'SÓ NA SINFONIA DE BEETHOVEN O DESTINO CHAMA E TORNA A CHAMAR, NA VIDA NÃO É ASSIM, HÁ OCASIÕES EM QUE TIVEMOS A IMPRESSÃO DE QUE ALGUÉM ESTAVA LÁ FORA À ESPERA, E QUANDO FOMOS VER NÃO ERA NINGUÉM, E HÁ OUTRAS EM QUE CHEGÁMOS APENAS UM SEGUNDO TARDE DEMAIS, E TANTO FAZIA, A DIFERENÇA É QUE, NESTE CASO, AINDA PODEMOS FICAR A PERGUNTAR-NOS, QUEM TERÁ SIDO, E LEVAR O RESTO DA VIDA A SONHAR COM ISSO."
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Se uma pessoa, para gostar doutra,estivesse á espera de conhecê-la, não lhe chegaria a vida inteira.
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a caverna
"e agora queria recuperar o tempo perdido, palavras estas insensatas entre as q mais o forem, expressão absurda com a qual supomos enganar a dura realidade de q nenhum tempo perdido é recuperavel, como se acreditassemos, ao contrario dessa verdade, que o tempo q criamos para sempre perdido teria afinal, resolvido ficar parado la atras, esperando, com a paciencia d quem dispõem do tempo todo, que dessemos por falta dele"
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"Se não pudermos ser totalmente humano, que não sejamos totalmente animais"
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"Suponho ter sido esta a única vez que, em qualquer parte do mundo, um sino, uma campânula de bronze inerte, depois de tanto haver dobrado pela morte de seres humanos, chorou a morte da Justiça. Nunca mais tornou a ouvir-se aquele fúnebre dobre da aldeia de Florença, mas a Justiça continuou e continua a morrer todos os dias. Agora mesmo, neste instante em que vos falo, longe ou aqui ao lado, à porta da nossa casa, alguém a está matando. De cada vez que morre, é como se afinal nunca tivesse existido para aqueles que nela tinham confiado, para aqueles que dela esperavam o que da Justiça todos temos o direito de esperar: justiça, simplesmente justiça. Não a que se envolve em túnicas de teatro e nos confunde com flores de vã retórica judicialista, não a que permitiu que lhe vendassem os olhos e viciassem os pesos da balança, não a da espada que sempre corta mais para um lado que para o outro, mas uma justiça pedestre, uma justiça companheira quotidiana dos homens, uma justiça para quem o justo seria o mais exacto e rigoroso sinónimo do ético, uma justiça que chegasse a ser tão indispensável à felicidade do espírito como indispensável à vida é o alimento do corpo. Uma justiça exercida pelos tribunais, sem dúvida, sempre que a isso os determinasse a lei, mas também, e sobretudo, uma justiça que fosse a emanação espontânea da própria sociedade em acção, uma justiça em que se manifestasse, como um iniludível imperativo moral, o respeito pelo direito a ser que a cada ser humano assiste." ( Da Justiça à Democracia, passando pelos sinos)
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" A existência do homem prova a inexsistência de Deus"
--------------------------------------------------------------------------------------"Das pessoas devia bastar saber como se chamam, e levarmos o resto da vida para saber quem são, se de fato um dia o saberemos, pois ser não é ter sido, ter sido não é será"
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A Caverna
"Que Deus te ponha a virtude,
que eu, por mim, fiz o que pude,
e não será tanto pela virtude adicional com que Deus,
sujeito como qualquer comum mortal a esquecimentos e imprevidências,
contribua para a coroação dos esforços cometidos,
mas pela consciência humilde de que se não chegamos a fazer o melhor
foi simplesmente porque de tal não éramos capazes.
Argumentar com o que tem de ser foi sempre uma perda de tempo,
para o que tem de ser os argumentos não passam de conjuntos
mais ou menos casuais de palavras que esperam receber da ordenação sintática
um sentido que elas próprias não estão seguras de possuir"
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O Homem Duplicado
É o silêncio cheia de palavras não ditas que salva o que se julgava perdido.
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se queres ser cego, sê-lo-ás” (p.129)
“na verdade ainda está por nascer o primeiro ser humano desprovido daquela segunda pele a que chamamos egoísmo” (p.169)
“Que temos de morrer, sabemo-lo desde que nascemos, Por isso, de uma certa maneira, é como se já tivéssemos nascido mortos” (p.196-197)
“a cegueira também é isto, viver num mundo onde se tenha acabado a esperança” (p.204)
“a cegueira também é isto, viver num mundo onde se tenha acabado a esperança” (p.204)
“[...] as lágrimas que sentido têm quando o mundo perdeu todo o sentido” (p.238)
“Pode ser que a humanidade venha a conseguir viver sem olhos, mas então deixara de ser humanidade” (p.244)
“Dentro de nós há uma coisa que não tem nome, essa coisa é o que somos” (p.262)
“Penso que não cegámos, penso que estamos cegos, Cegos que vêem, Cegos que, vendo, não vêem” (p.310)...
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"...o sonho é um prestigiador hábil, muda as proporções das coisas e suas distâncias, separa as pessoas, e elas estão juntas, reúne-as, e quase não se vêem uma à outra..."
(Saramago-O conto da ilha desconhecida)
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"... aí estava como os seus pressentimentos tinham saído certo, algo de singular, de fora do comum, se estivera preparando nos últimos tempos, e agora chegara a hora em que a sorte, ou o destino, ou o acaso, ou a instabilidade das vontades e sujeições humanas, iriam decidir da sua existência."
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"De Deus e da morte não se têm contato, senão histórias". (p. 146)
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"[...] em toda verdade humana ha sempre algo de angustioso. de aflito, nós somos, e não estou a me referir simplismente à fragilidade da vida, somos uma pequena e tremula chama, que a cada instante ameaça apagar-se, e temos medo, acima de tudo temos medo [...]"
SARAMAGO, José. Ensaio sobre a lucidez. São Paulo: Companhia das Letras, 2004, p.56.
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...as palavras proferidas pelo coração não tem lingua que as articule, retém-nas um nó na garganta e só nos olhos é que se podem ler.
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É com o que é que temos de viver, não com o que seria ou poderia ter sido".
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Saberíamos muito mais da vida, se nos aplicássemos com afinco a estudar suas contradições".
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A Caverna
"O que mais uma vez nos demonstra que nunca nos deveríamos sentir seguros daquilo que pensamos ser porque, nesse momento, poderá muito bem suceder que já estejamos a ser coisa diferente."
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"...dizemos aos confusos, Conhece-te a ti mesmo,
como se conhecer-se a si mesmo não fosse
a quinta e mais dificultosa operação
das aritméticas humanas..."
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"com as palavras todo o cuidado é pouco, mudam de opinião como as pessoas"
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"É por de mais sabido que o espírito humano, muitas vezes, tomas decisões cujas causas mostra não conhecer, sendo de supor que o faz depois de ter percorrido os caminhos da mente com tal velocidade que depois não é capaz de os reconhecer e muito menos reencontrar."

Todos os Nomes.
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as intermitências da morte
Aí está uma palavra que soa bem [metamorfose], cheia de promessas e certezas, dizes metamorfose e segues adiante,
parece que não vês que as palavras são rótulos que se pegam às cousas, não são cousas, nunca saberás como são as cousas,
nem sequer que nomes são na realidade os seus, porque os nomes que lhes deste não são mais do que isso, os nomes que lhes deste.
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de saramago

"... às vezes perguntamo-nos porque tardou tanto a felicidade a chegar, por que não veio mais cedo, mas se nos aparece de improviso, como neste caso, quando já não a esperávamos, então o mais provável é que não saibamos que fazer, e não é tanto a questão de escolher entre o rir e o chorar, é a secreta angústia de pensar que talvez não consigamos estar à altura." José Saramago

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"Quantas vezes, para mudar a vida, precisamos da vida inteira, pensamos tanto, tomamos balanço e hesitamos, depois voltamos ao princípio, tornamos a pensar e a pensar, deslocamo-nos nas calhas do tempo com um movimento circular, como os espojinhos que atravessam o campo levantando poeira, folhas secas, insignificancias, que para mais não lhes chegam as forças, bem melhor seria vivermos em terras de tufões. Outras vezes uma palavra é quanto basta." A jangada de pedra - saramago
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"(...) as velhas fotografias enganam muito, dão-nos a ilusão de que estamos vivos nelas, e não é certo, a pessoa para quem estamos a olhar já não existe, e ela, se pudesse ver-nos, não se reconheceria em nós." (Todos os nomes)

“(...) a pele é tudo quanto queremos que os outros vejam de nós, por baixo dela nem nós próprios conseguimos saber quem somos.” (Todos os nomes)

"(...) somos uma pequena e trémula chama que a cada instante ameaça apagar-se (...)" (Ensaio sobre a lucidez)

"A cabeça dos seres humanos nem sempre está completamente de acordo com o mundo em que vivem, há pessoas que tem dificuldade em ajustar-se à realidade dos factos, no fundo não passam de espíritos débeis e confusos que usam as palavras, às vezes habilmente, para justificar a sua covardia." (Ensaio sobre a lucidez)
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"Dentro de nós há uma coisa que não tem nome, essa coisa é o que somos."
do Ensaio sobre a Cegueira
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- "Se antes de cada ato nosso nos pusessemos a prever todas as consequências dele, a pensar nelas a sério, primeiro as imediatas, depois as prováveis, depois as possíveis, depois as imagináveis, não chegariamos sequer a mover-nos de onde o primeiro pensamento nos tivesse feito parar".
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"Até amanhã. É interessante como levamos todos os dias da via a despedir-nos dizendo e ouvindo dizer até amanhã,e fatalmente,em um desses dias,o que foi último para alguém,ou já não está aquele a quem o dissemos,ou já não estamos nós que o tínhamos dito.Veremos se nete amanhã de hoje,a que também costumamos chamar dia seguinte,encontrando-se uma vez mais o presidente da câmara e seu motorista particular,serão eles capazes de compreender até que ponte é extraordinário,até que ponto foi quase um milagre terem dito até amanhã e verem que se cumpriu como certeza o que não havia sido mais que uma problemática probabilidade"
Ensaio sobre a lucidez
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Ficaria com: “Porque ainda está para nascer o primeiro homem desprovido daquela segunda pele a que chamamos egoísmo, muito mais dura que a primeira, que a tudo sangra.” (Ensaio sobre a cegueira)
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"Tolerar a existência do outro e permitir que ele seja diferente ainda é muito pouco. Quando se tolera, apenas se concede, e essa não é uma relação de igualdade, mas de superioridade de um sobre o outro."
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"O que chamamos cegueira era algo que se limitava a cobrir a aparência dos seres e das coisas, deixando-os intactos por trás de um véu negro"

"Nessa noite o cego sonhou que estava cego"

"Fizemos dos olhos uma espécie de espelhos virados para dentro"

"É dessa massa que somos feitos, metade de indiferença e metade de ruindade"
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"O Bem e o Mal não existem em si mesmos,cada um deles é somente a ausência do outro".(Evangelho)
"Se podes olhar,vê.Se podes ver,repara".(Ensaio sobre a Cegueira)
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Na tarde deste mesmo dia, como já havíamos antecipado, chegou à redacção do jornal uma carta da morte exigindo, nos termos mais enérgicos, a imediata rectificação do seu nome, senhor director, escrevia, não sou a Morte, sou simplesmente morte, a Morte é uma cousa que aos senhores nem por sombra lhes pode passar pela cabeça o que seja, vossemecês, os seres humanos, só conhecem, tome nota o gramático de que eu também saberia pôr vós, os seres humanos, só conheceis esta pequena morte quotidiana, que eu sou, está que até mesmo nos piores desastres é incapaz de impedir que a vida continue, um dia virão a saber o que é a Morte com letra grande, nesse momento, se ela, improvavelmente, vos desse tempo para isso, perceberíes a diferença real que há entre o relativo e o absoluto, entre o cheio e o vazio, entre o ainda ser e o não ser já, e quando falo de diferença real, estou referir-me a algo que as palavras jamais poderão exprimir, (...)

As intermitências da morte.
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"Não somos nós quem tomamos as decisões, são elas que nos tomam a nós..."
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" quando a minha nuvem fechada está sobre a tua nuvem fechada às vezes falta bem pouco pra que a tua à minha se junte "
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"...que nós todos continuaremos a mentir quando dissermos a verdade, que continuaremos a dizer a verdade quando estivermos a mentir, tal como ele, tal como você,..." J. Saramago - Ensaio sobre a lucidez.
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"Essas palavras, que, provavelmente, tal como se apresentam, ninguém as haveria dito antes, essas palavras tiveram a sorte de não se perderem umas das outras, tiveram quem as juntasse, quem sabe se o mundo não seria um pouco mais decente se soubessemos como reunir umas quantas palavras que andam por aí soltas, Duvido que alguma vez as pobres desprezadas venham a encontrar-se, Também eu, mas sonhar é barato, não custa dinheiro"

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Mal informados sobre a narureza profunda da Morte, cujo outro nome é fatalidade, os jornais têm-se excedido em furiosos ataques conta ela, acusando-a de impiedosa, cruel, tirana, malvada, sanguinária, vampira, imperatriz do mal, drácula de saias, inimiga do género humano, desleal, assassina, traidora, serial killer, outra vez, e houve até um semanário, dos humorísticos, que, espremendo o mais que pôde o espírito sarcástico dos seus criativos, conseguiu chamar-le filha-da-puta.

quarta-feira, dezembro 17, 2008

"O senhor mire e veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas- mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam. Verdade maior. Foi o que a vida me ensinou."(Guimarães Rosa)

Ausência

Por muito tempo achei que a ausência é falta.E lastimava, ignorante, a falta.Hoje não a lastimo.Não há falta na ausência.A ausência é um estar em mim.E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,que rio e danço e invento exclamações alegres,porque a ausência, essa ausência assimilada,ninguém a rouba mais de mim.(Carlos Drummond de Andrade)

Considero a vida uma estalagem onde tenho que me demorar até que chegue a diligência do abismo. Não sei onde ela me levará, porque não sei nada. Poderia considerar esta estalagem uma prisão, porque estou compelido a aguardar nela; poderia considerá-la um lugar de sociáveis, porque aqui me encontro com outros. Não sou, porém, nem impaciente nem comum. Deixo ao que são os que se fecham no quarto, deitados moles na cama onde esperam sem sono; deixo ao que fazem os que conversam nas salas, de onde as músicas e as vozes chegam cómodas até mim. Sento-me à porta e embebo meus olhos e ouvidos nas cores e nos sons da paisagem, e canto lento, para mim só, vagos cantos que componho enquanto espero.
PESSOA, Fernando. Livro do desassossego. São Paulo, Companhia das Letras, 2006. p. 42.

"... com a tripa em sossego qualquer um tem idéias, discutir, por exemplo, se existe uma relação direta entre os olhos e os sentimentos, ou se o sentido da responsabilidade é a conseqüência natural de uma boa visão, mas quando a aflição aperta, quando o corpo se nos desmanda de dor e angústia, então é que se vê o animalzinho que somos"
saramago