quinta-feira, maio 03, 2012

Na fachada estragada pelo tempo lia-se numa placa: “II y a toujours quelque choe d’abient qui me tourmente” (Existe sempre alguma coisa ausente que me atormenta) — frase de uma carta escrita por Camilie Claudel a Rodín, em 1886. Daquela casa, dizia aplaca, Camille saíra direto para o hospício, onde permaneceu até a morte. Perdida de amor, de talento e de loucura.


Era isso — aquela outra vida, inesperadamente misturada à minha, olhando a minha opaca vida com os mesmos olhos atentos com que eu a olhava: uma pequena epifania. Em seguida vieram o tempo, a distância, a poeira soprando. Mas eu trouxe de lá a memória de qualquer coisa macia que tem me alimentado nestes dias seguintes de ausência e fome. Sobretudo à noite, aos domingos. Recuperei um jeito de fumar olhando para trás das janelas, vendo o que ninguém veria.CFA

" Eu sou sim a pessoa que some, que surta, que vai embora, que aparece do nada, que fica porque quer, que odeia a falta de oxigênio das obrigações, que encurta uma conversa besta, que estende um bom drama, que diz o que ninguém espera e salva uma noite, que estraga uma semana só pelo prazer de ser má e tirar as correntes da cobrança do meu peito. Que acha todo mundo meio feio, meio bobo, meio burro, meio perdido, meio sem alma, meio de plástico, meia bomba. E espera impaciente ser salva por uma metade meio interessante que me tire finalmente essa sensação de perna manca quando ando sozinha por aí, maldizendo a tudo e a todos. Eu só queria ser legal, ser boa, ser leve. Mas dá realmente pra ser assim? " [ Tati Bernardi ]


"De tanto não poder dizer,meus olhos deram de falar,só falta você ouvir"
Alice Ruiz


"Tenho de ter paciência para não me perder dentro de mim:
vivo me perdendo de vista.
Preciso de paciência porque sou vários caminhos,
inclusive o fatal beco sem saída."

Clarice Lispector



Sumi porque só faço besteira em sua presença, fico mudo quando deveria verbalizar, digo um absurdo atrás do outro quando melhor seria silenciar, faço brincadeiras de mau gosto e sofro antes, durante e depois de te encontrar.
Sumi porque não há futuro e isso não é o mais difícil de lidar, pior é não ter presente e o passado ser mais fluido que o ar.
Sumi porque não há o que se possa resgatar, meu sumiço é covarde mas atento, meio fajuto meio autêntico, sumi porque sumir é um jogo de paciência, ausentar-se é risco e sapiência, pareço desinteressado, mas sumi para estar para sempre do seu lado, a saudade fará mais por nós dois que nosso amor e sua desajeitada e irrefletida permanência.

[Martha Medeiros]




"Descobri que minha obsessão por cada coisa em seu lugar, cada assunto em seu tempo, cada palavra em seu estilo, não era o prêmio merecido de uma mente em ordem, mas pelo contrário, todo um sistema de simulação inventado por mim para ocultar a desordem da minha natureza. Descobri que não sou disciplinado por virtude, e sim como reação contra a minha negligência; que pareço generoso para encobrir minha mesquinhez, que me faço passar por prudente quando na verdade sou desconfiado e sempre penso o pior, que sou conciliador para não sucumbir às minhas cóleras reprimidas, que só sou pontual para que ninguém saiba como pouca me importa o tempo alheio. Descobri, enfim, que o amor não é um estado da alma e sim um signo do zodíaco."

Gabriel Gárcia Marques - Memórias de minhas putas tristes (pág 74)


"É assim que imagino Deus, como um fino fio de nylon, invísivel, que procura minhas contas no fundo do mar e as devolve a mim como um colar"

[Rubem Alves]



Você não brinca com uma criança ou colore uma figura com ela para mostrar sua superioridade. Pelo contrário, você escolhe se limitar para facilitar e honrar o relacionamento. Você é capaz de perder uma competição como um ato de amor. Isso não tem nada a ver com ganhar ou perder, e sim com amor e respeito :)

[ A Cabana ]


"faz tempo que, para pensar sobre Deus, eu não leio teólogos; leio os poetas."
(Rubem Alves)



"(...) E eu não gosto de mim. Ou gosto ? Não sei. Talvez pareça não gostar justamente poque gosto muito, então exijo demais de meu corpo, e as coisas erradas que ele faz - São tantas ! - me fazem detestá-lo. A gente sempre exige mais das pessoas e das coisas que quer bem, as que queremos mal ou simplesmente não queremos noa são indiferentes. (...) "" (...) A toda hora, em todos os lugares, a morte está se oferencendo. Mais difícil é continuar vivendo. Eu continuo. Não sei se gosto, mas tenho uma curiosidade imensa pelo que vai me acontecer, pelas pessoas que vou conhecer, por tudo que vou dizer e fazer e ainda não sei como será. (...)"" (...) Só agora eu sinto que as minhas asas eram maiores que as dele, e que ele se contentava com ares baixos: eu queria grandes espaços, amplitudes azuis onde meus olhos pudessem se perder e meu corpo pudesse se espojar sem medo nenhum. (...) "CFA


Que a vida ensine que tão ou mais difícil do que ter razão, é saber tê-la.
Que o mar mare.
Que a cor core.
Que o abraço abrace.
Que o perdão perdoe.
Que tudo vire verbo e verbe.
Verde. Como a esperança.
A vida é substantiva, nós é que somos adjetivos.

[Arthur da Távola]



"Não me venha dizer que a natureza não é um milagre. Não me diga que o mundo não é um conto de fadas. Quem não percebeu isso, talvez só chegue a compreendê-lo quando a história estiver chegando ao fim. Porque, então, nós temos uma derradeira possibilidade de tirar os antolhos, uma derradeira possibilidade de nos entregarmos a este milagre do qual temos de nos despedir, o qual temos de deixar."

- Jostein Gaarder


Paulo Roberto Gaefke
Tenho, nas minhas mãos, dois caminhos, duas decisões, mesmo quando tudo parece desabar, cabe a mim decidir, entre rir ou chorar, ir ou ficar, entre desistir ou lutar. Se o mar está revolto, posso ficar na praia ou sair para pescar e, talvez, nunca mais voltar. Tenho, nas minhas mãos, o bem e o mal, e entre eles, poucos pensamentos, um diz para fazer sem culpa, o outro pensa, reflete e pede para esperar. Enquanto o mundo se perde em erros, posso me manter sereno, sem medo porque tenho a chave da minha vida nas minhas mãos. Então, hoje, me sinto mais forte, pois atravessei o deserto da alma, amei quem não me amou e deixei de lado quem muito me amava. Atravessei caminhos nem sempre floridos, que deixaram marcas profundas em mim, mas amei e fui amado... Por isso tenho em minhas mãos, bem mais que a vida, tenho a dúvida e a certeza, a esperança e o medo, o desejo e a apatia, o trabalho e a preguiça. E me dou o direito de errar sem me cobrar, e acertar sem me gabar, porque descobri, no caminho incerto da vida, que o mais importante é decidir. E decidi, de uma vez por todas, ser feliz e esse caminho não tem volta...


Então quero que você venha para deitar comigo no meu quarto novo, para ver minha paisagem além da janela, que agora é outra, quero inaugurar meu novo estar-dentro-de-mim ao teu lado, aqui, sob este teto curvo e quebrado, entre estas paredes cobertas de guirlandas de rosas desbotadas. Vem para que eu possa acender incenso do Nepal, velas da Suécia na beirada da janela, fechar charos de haxixe marroquino, abrir armários, mostrar fotografias, contar dos meus muitos ou poucos passados, futuros possíveis ou presentes impossíveis, dos meus muitos ou nenhuns eus. Vem para que eu possa recuperar sorrisos, pintar teu olho escuro com kol, salpicar tua cara com purpurina dourada, rezar, gritar, cantar, fazer qualquer coisa, desde que você venha, para que meu coração não permaneça esse poço frio sem lua refletida. Porque nada mais sou além de chamar você agora, porque tenho medo e estou sozinho, porque não tenho medo e não estou sozinho, porque não, porque sim, vem e me leva outra vez para aquele país distante onde as coisas eram tão reais e um pouco assustadoras dentro da sua ameaça constante, mas onde existe um verde imaginado, encantado, perdido. Vem, então, e me leva de volta para o lado de lá do oceano de onde viemos os dois."cfa


"No fim tu hás de ver que as coisas mais leves são as únicas
que o vento não conseguiu levar:
um estribilho antigo
um carinho no momento preciso
o folhear de um livro de poemas
o cheiro que tinha um dia o próprio vento..."
Mário Quintana