quinta-feira, dezembro 29, 2011

"Sempre me senti diferente dos outros. Não mais bonita, não mais inteligente, não mais especial, não mais esperta, não mais maluca, não mais legal, apenas diferente. Sou diferente na forma de sentir, tudo que me toca, me toca fundo. Tudo que me alegra, me alegra muito. Tudo que me dói, dói forte, corta. Nunca tive muitos freios em matéria de sentimento. Sempre que eu quis ir, fui. Muito me estrepei. Sempre que quis falar, falei. Muito me ralei. Aprendi um pouco a calar, a tentar respirar fundo e pensar."

cfa

Ontem chorei. Por tudo que fomos. Por tudo o que não conseguimos ser. Por tudo que se perdeu. Por termos nos perdido. Pelo que queríamos que fosse e não foi. Pela renúncia. Por valores não dados. Por erros cometidos. Acertos não comemorados. Palavras dissipadas.Versos brancos. Chorei pela guerra cotidiana. Pelas tentativas de sobrevivência. Pelos apelos de paz não atendidos. Pelo amor derramado. Pelo amor ofendido e aprisionado. Pelo amor perdido. Pelo respeito empoeirado em cima da estante. Pelo carinho esquecido junto das cartas envelhecidas no guarda- roupa. Pelos sonhos desafinados, estremecidos e adiados. Pela culpa. Toda a culpa. Minha. Sua. Nossa culpa. Por tudo que foi e voou.

“Não se concentre tanto nas minhas variações de humor, apenas insista em mim. Se eu calar, me encha de palavras, me faça querer dizer outra e outra vez sobre você, sobre nós, e todo esse amor. Se eu chorar, não me faça muitas perguntas, não precisa nem secar minhas lágrimas. Só me diz que você continuará comigo pra tudo, que tenho teu colo e teu carinho. E ainda que te doa me ver assim, me envolva nos teus braços e diga que eu posso chorar, mas que você não sairá dali enquanto eu não sorrir. Porque é isso que nos importa, não é? O sorriso um do outro. Não é?”

Eu não sabia, Senhor, que o mundo era tão vasto e doloroso.
E que desejando a vastidão do mundo meu coração conheceria também a vastidão da dor. Por que, Senhor Meu, permitiste que eu tentasse fugir da minha pequenez?
Por que me deste todos esses sonhos, muito maiores do que eu?

cfa

Vai passar, tu sabes que vai passar. Talvez não amanhã, mas dentro de
uma semana, um mês ou dois, quem sabe? O verão está ai, haverá sol quase
todos os dias, e sempre resta essa coisa chamada "impulso vital". Pois
esse impulso às vezes cruel, porque não permite que nenhuma dor insista
por muito tempo, te empurrará quem sabe para o sol, para o mar, para uma
nova estrada qualquer e, de repente, no meio de uma frase ou de um
movimento te supreenderás pensando algo como "estou contente outra vez".
Ou simplesmente "continuo", porque já não temos mais idade para,
dramaticamente, usarmos palavras grandiloqüentes como "sempre" ou
"nunca". Ninguém sabe como, mas aos poucos fomos aprendendo sobre a
continuidade da vida, das pessoas e das coisas. (...)

sábado, dezembro 03, 2011

Lygia Fagundes

"Os dedicados podem ter vocação para o piano. Para o tatro. Para a poesia. para o magistério. Vocação para a máquina, aquele que era um tremendo joalheiro. O primo era outro delicado, um físico raro que estudava a estrutura da bolha de sabão. Mas nenhum com vocação para viver. Minha colega de academia não contava as pílulas dos tubos que ia engolindo, um primo míope tirava os óculos para não ver o sangue enquanto ia cortando os pulsos com gilete azul. Todos os delicadíssimos saindo pela porta da morte que é a mais fácil. Sem olhar pra trás. E os fortes? Na classificação sumária, acho que somos fortes apenas porque estamos vivos. E fazendo tudo para seguir nesse estado, mais do que isso, lutando por essa vida."